Encontro Estadual das Feiras Agroecológicas debate o fortalecimento da agroecologia e propostas para ampliar o acesso à alimentos saudáveis
No dia 23 de abril, marcando um momento histórico, estiveram reunidos em Passo Fundo/RS representantes de mais de 20 feiras agroecológicas que acontecem em cidades gaúchas, além de entidades de assessoria técnica, sindicatos, cooperativas e organizações que apoiam a produção agroecológica. O evento, que reuniu mais de 250 pessoas, foi organizado pelo Cetap (Centro de Tecnologias Alternativas Populares), pela Cáritas Arquidiocesana de Passo Fundo e pela Coonalter (Cooperativa Mista e de Trabalho Alternativa) e também destacou os 25 anos da Feira Ecológica de Passo Fundo.
As feiras ecológicas são espaços promotores da agroecologia e de diferentes dinâmicas de comercialização. Elas são importantes tanto no apoio e viabilidade econômica da agricultura familiar agroecológica, como no abastecimento de alimentos saudáveis para os centros urbanos. A partir da trajetória e do aprendizado de diferentes feiras ecológicas gaúchas, o encontro buscou discutir propostas para o fortalecimento da agroecologia e construção de políticas públicas de apoio à agricultura familiar e garantia do abastecimento e segurança alimentar nas cidades.
Uma apresentação do Grupo de Percussão do Lar da Menina Padre Paulo Farina, da Fundação Lucas Araújo, de Passo Fundo, marcou o início das atividades da manhã. Mais de 30 crianças e adolescentes animaram os participantes com seus ritmos contagiantes. Na sequência, o biblista e teólogo Marcelo Barros fez uma fala sobre ecologia e espiritualidade. Destacou que não basta pensar só no próprio corpo e nos alimentos consumidos para a própria saúde, sem considerar como eles são produzidos e os impactos na natureza. É preciso cuidar da terra, da água e do ambiente de forma integrada, como um todo, nos inserindo nele, pois só assim teremos condições de preservar as condições para que todos possam continuar se alimentando com produtos de qualidade.
A mesa de abertura contou com a presença de Laércio Meireles, pelo consórcio de ONGs de assessoria em agroecologia no estado, Eliane Brochet, pelo Consea-RS (Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional), Franciele Bele, pelas feiras ecológicas de Porto Alegre, Álvaro Delatorre, da direção do MST e das feiras ecológicas de Porto Alegre, Adriana Tozo, representando o deputado estadual Adão Preto Filho, Gilmar Vieira, representando a deputada federal Maria do Rosário, Renê Tortelli, pela Cresol, Alceu Primel, pela Coonalter, Luiz Costela, pela Cáritas e Edson Klein, pelo Cetap. Foi destaque o ineditismo deste encontro e a necessidade de momentos como este, para ampliar a articulação e propor ações conjuntas.
Em complemento as falas iniciais, aconteceu uma roda de conversa para discutir a importância das feiras como promotora da agroecologia e de diferentes dinâmicas de comercialização para o abastecimento das populações urbanas. Nelsa Nespolo, da Unisol (Central de Empreendimentos Econômicos Solidários), Álvaro Delatorre, das feiras de Porto Alegre, Ana Meireles, das feiras do litoral, Maristela Ferro, produtora agroecológica, Giovani Gonçalves e Alvir Longhi, do Cetap participaram deste momento.
Falar de feiras ecológicas é falar de soberania e segurança alimentar e também de sucessão familiar. As feiras cumprem um papel muito importante na agricultura familiar, especialmente na economia doméstica e na valorização de jovens e mulheres. Neste sentido, políticas públicas de fomento às feiras e organização produtiva de jovens e mulheres é fundamental para manutenção da diversidade e da força de trabalho nos espaços rurais.
Nunca antes a alimentação e cultura alimentar dos povos esteve tão reduzida a poucos cultivos e tão concentrada, sob controle de grandes corporações do agronegócio. Não existe território autônomo se não se garante a soberania alimentar, por isso o ato de se alimentar tem dimensão política e a fome também expressa um modelo de relação social. A alimentação saudável e seus modelos de produção precisam ser trabalhados na educação das crianças e jovens. Desenvolver a agroecologia é estabelecer laços de sociabilidade e cooperação.
É preciso acreditar na acumulação que não seja de capital, mas de qualidade de vida. “Seu jeito de consumir é um jeito de preservar e de cuidar”. As feiras tem relação direta com o momento de emergência climática, pois trabalham com circuitos curtos e oferecem alimentos com um custo energético muito menor, tanto na da produção, como na comercialização. Os produtos da biodiversidade nativa encontraram nas feiras um espaço de valorização que desencadeou novas perspectivas de cultivo e de organização do trabalho na agricultura familiar e entre organizações de assessoria técnica.
A roda de conversa também afirmou a necessidade de viabilizar espaços de continuidade de encontros como este, com a criação de um fórum onde as feiras possam se articular, pautar demandas, elaborar propostas coletivas e participar da construção de políticas públicas sobre produção, processamento e comercialização de alimentos.
Durante o encontro foi elaborada uma carta reafirmando a importância das feiras ecológicas como promotoras da agroecologia. Uma equipe está responsável por incorporar as manifestações feitas durante a roda de conversa e dar uma redação final ao documento, que será divulgado em breve. Também foi aprovada uma moção de apoio às Feiras Ecológicas de Porto Alegre, documento que será entregue para a Prefeitura Municipal com relação ao regramento que está sendo proposto.
A trajetória das três organizações anfitriãs do encontro teve e mantém papel importante para a produção agroecológica na região e na história dos 25 anos da Feira Ecológica de Passo Fundo. Neste sentido, foram homenageados o atual presidente da Coonalter, Alceu Primel e também familiares de três presidentes da cooperativa já falecidos: João Maria, Jair Pressi e Fernando Cé. Luiz Costela e Eliane Brochet receberam a homenagem pelos 60 anos da Cáritas e Edson Klein, pelos 37 anos do Cetap. A família do senhor Theobaldo Ângelo Locatelli também recebeu uma homenagem pelo pioneirismo e dedicação em criar uma área urbana de referência em promoção da agroecologia, conservação e uso da biodiversidade, local onde atualmente funciona a sede do Cetap.
Todos os presentes puderam aproveitar um almoço preparado exclusivamente com alimentos agroecológicos. O preparo foi feito pelo grupo de mulheres da agroindústria Flor de Pitanga, de Itatiba do Sul/RS. Além de uma mesa vegetariana, a paçoca de pinhão e o porco crioulo assado e servido com calda de frutas nativas, foram muito elogiados. Na parte da tarde, os participantes tiveram um momento de integração, com música ao vivo e festejos pelos 25 anos da Feira Ecológica de Passo Fundo.
Este evento foi uma atividade apoiada pelo projeto de cooperação para promoção da agricultura sustentável e segurança alimentar, desenvolvido pelo CETAP em parceria com a Fundação Interamericana (IAF) e também integrou as ações do projeto “Consumidores e Agricultores em Rede”, desenvolvido pelo CETAP, Cepagro, AS-PTA e Centro Vianei, com apoio da Misereor.
Fotos: Thaís Brock e Flávia Biondo da Silva